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Enquanto narrativa de marca, o branded content se esforça para ser relevante para a audiência. Com menos ou mais exposição de produtos e logotipos, o que importa é a relevância que determinada narrativa tem para o público ao qual se destina.  Se a conexão afetiva com a narrativa é de escolha própria e subjetiva do público, houve mérito de quem enuncia: a marca.

Para a Agência Nacional do Cinema, a Ancine, é preciso discriminar na largada quando determinados produtos audiovisuais que se apresentam como narrativas focadas na audiência são, apesar dos esforços de não o parecerem, essencialmente publicitários. Nossa tese incentiva classificar toda e qualquer narrativa promovida por marcas com intuito de conexão afetiva com ao público de branded content. Mas, para a Ancine, algumas destas narrativas serão classificadas como estritamente publicitárias; outras, como um conteúdo audiovisual convencional, mesmo que seu financiamento tenha sido feito por um anunciante. Isso é necessário para fiscalizar o uso do dinheiro público e os espaços publicitários nos meios audiovisuais regulados, como os canais de TV aberta e fechada.

Faltam ainda critérios mais objetivos para esta classificação – inclusive porque falta ainda literatura que embase a classificação na própria academia para amparar agentes institucionais e de mercado. Por isso, qualquer marca está ainda sujeita a uma interpretação subjetiva também do ponto de vista da fiscalização.

Conversei com o advogado Rodrigo Chacon, do escritório especializado na relação com o mercado de mídia e entretenimento audiovisual, com quem já tive a oportunidade de trabalhar em uma narrativa audiovisual para a marca Comfort-Unilever (Se Essa Roupa Fosse Minha). Esta narrativa teve sua interpretação pela Ancine como produto audiovisual cultural, em linha com a visão dos sócios: Conspiração, Grupo Globo e Unilever.  A série de 13 episódios, de fato, não enaltecia discursos publicitários ou produtos. Trazia, sim, as três apresentadoras (Ana Paula Xongani, Giovana Nader e Marina Franco) na busca por peças icônicas em brechós, sua ressignificação no atual contexto de moda e as dicas de cuidados para roupas que possibilitam comprar menos e guardar itens essenciais – era neste momento que Comfort aparecia como componente do serviço ao consumidor.

Rodrigo Chacon, Cesnik, Quintino e Salinas Advogados

BCB – Existe uma clareza na Lei audiovisual que embase critérios editoriais tanto na produção quanto na avaliação da Ancine do quanto uma narrativa de branded content está mais para publicidade ou mais para conteúdo?

R – Existe um limbo na lei. Nenhum dos dispositivos utilizados no mercado (3A e o, agora suspenso, 1A) determinam limites com clareza. O que diferencia é o tom que o produtor dá na narrativa, não expondo o produto demasiadamente ou transformando-a em propaganda, e da própria avaliação da Ancine, que vai analisar em que esfera o produto se encontra exposto na obra audiovisual, e se isto faz com que sua inserção transforme a obra em publicitária ou não.

BCB – Então, as marcas podem endossar narrativas. Mas está na Ancine a determinação se determinados produtos audiovisuais alcançaram este objetivo, certo?

R – Sim, é uma questão de interpretação. É até mais simples: se mesmo aquele que é leigo assiste e entende que o produto é publicidade, a classificação tende a ter um potencial maior de ser considerada como publicitária pela Ancine. Se entender como conteúdo, a probabilidade de ser classificado como publicitária será muito menor, sendo recomendada sempre uma análise caso a caso já que a forma que um produto ou serviço pode ser inserido em uma obra audiovisual é muito diferente de projeto para projeto..

BCB – Qual o papel da fundamentação em critérios mais objetivos e de pesquisa no amparo a avaliações mais objetivas por parte da agência reguladora e para auxiliar produtores e financiadores de narrativas endossadas por marca a construir produtos que não se assemelhem à publicidade tradicional?

R – O papel fundamental de critérios mais claros e objetivos por parte da Ancine, e outras agências reguladoras, em relação a possibilidade de inserção de produtos e serviços em obras audiovisuais é o de trazer uma maior segurança jurídica a estas práticas, o que potencializaria o seu uso e aumentaria as possibilidades de financiamento para novos projetos audiovisuais. A falta de clareza faz com que menos patrocinadores coloquem seus recursos nestes projetos, o que acaba sendo prejudicial para todos na cadeia do mercado.

Se Essa Roupa Fosse Minha (Conspiração, Grupo Globo e Unilever)
Leonardo Moura

Autor Leonardo Moura

Criador do Branded Content Brasil.

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